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Porto Alegre, RS, Brazil
Acredito que um blog legal é aquele que te ensina algo, que te faz viajar, que fala sobre: lugares, pessoas, culturas, montanhas, preservação da natureza, ... Espero que você goste dos textos que escrevi, interaja com o conteúdo, deixe um comentário, opinião ou sugestão e se anime a contar as suas histórias também.

sexta-feira, 23 de julho de 1999

De volta pra casa.

Nossa viagem de volta ao Brasil, mesmo com todos os objetivos atingidos, foi igualmente desgastante. Voltamos pelo mesmo caminho, mas desta vez em ônibus mais confortáveis e na 1º classe do Trem da Morte. Após seis dias estávamos de volta em nossas casas. Foram 15 dias na estrada! Viagens como esta nos ensinam muito. Ensinam a tomar melhores decisões perante as dificuldades, a trabalhar em grupo e até mesmo tomar uma decisão por todos. Nos ensina sobre a cultura de diversos povos de uma maneira explícita, melhor que em qualquer sala de aula. E o mais importante - não existe melhor forma de se fazer novos amigos, sejam eles do Brasil ou do Japão. Não há experiência melhor de organização e administração de recursos do que colocar uma mochila nas costas e saber que tudo o que você vai precisar está ali dentro. Para quem gosta de viajar não importa para onde vai, o importante é nunca deixar de conhecer este maravilhoso mundo que está além de sua janela. Para ler mais:
MOTTA, Sérgio. Machu Picchu - Na trilha da Aventura. Ed. Ediouro. 1996.ZERECEDA, Oscar C. Machupicchu - Universidad Inka. Centro de Estúdios Regionales e Andinos Bartolome de lãs Casas. 1999.

quinta-feira, 22 de julho de 1999

Macchu Picchu

Antes mesmo de amanhecer, tomamos café e desmontamos nosso bivaque. Vestimos nossas mochilas e de lanterna na cabeça, nós e mais 50 pessoas, silenciosamente, caminhamos até a Porta do Sol. Parecia que, naquele momento, estávamos participando de um ritual. Após 1 hora de caminhada chegamos. Neste local, pessoas de várias as línguas, raças e crenças se reúnem e aguardam o sol nascer e mostrar a todos a esperada cidade - Machu Picchu, que agora estava bem a nossa frente. O dia amanheceu frio, mas assim que os primeiros raios do Sol atravessaram o portal e avistamos Machu Picchu, o momento foi fascinante e de indescritível beleza. Ficamos observando até que o Sol nos aquecesse e cobrisse toda a cidade. Só então começamos a descer em direção a Machu Picchu, que agora ficava a uns 15 minutos descendo pela trilha. Não é permitido entrar em Machu Picchu com mochilas. Nossas companheiras de viagem teriam que ser deixadas num local apropriado e seguro, onde todas os montanhistas e turistas deixam suas bagagens - pagamos um dólar pelo serviço. Em Machu Picchu existe uma bem organizada infraestrutura. O parque conta com: bares, restaurantes, posto médico e ônibus que, a toda hora, levam e trazem da estação de trem, pessoas que fazem a trilha ou que só querem visitar Machu Picchu. Os administradores do parque tomaram todas as providências para que, mesmo com a exploração comercial, a cidade permanecesse protegida. A energia do local é muito forte. A construção das casas, a arquitetura, as áreas agrícolas, os locais sagrados, assim como as fontes e dutos de água cuidadosamente projetados para irrigar toda a cidade estão lá até hoje funcionando. Realmente é muito difícil descrever o clima do local e a beleza que, mesmo depois de descoberta pelo homem, ainda permanece na cidade. Após andarmos por todos os cantos e tirarmos muitas fotos chegou a hora de partir. Decidimos descer até Águas Claras, um pequeno vilarejo de onde sai o trem que nos levaria de volta a Cuzco. Depois de uma hora em um micro-ônibus, chegamos a estação. Compramos as passagens e ficarmos mais de uma hora esperando o trem. Na volta constatamos que a viagem de trem é muito bonita e que vale mais a pena ir até a entrada do parque por este meio do que alugar outro veículo. Chegamos em Cuzco a noite. Nosso principal objetivo era descansar e comer algo especial. Resolvemos ficar mais dois dias nos perdendo pela cidade, fazendo compras, visitando museus e absorvendo o máximo de cultura que a ela poderia nos oferecer. Cuzco possui uma característica bem particular. Mesmo passando por muita dificuldade econômica e grande desigualdade social, o povo é muito alegre e hospitaleiro

quarta-feira, 21 de julho de 1999

Dormindo sob o céu estrelado.

No dia seguinte, ao acordar, a visão que tínhamos era surpreendente, logo a nossa frente imponentes montanhas nevadas sob um lindo céu azul. Após o famoso desjejum: leite com Nescau, aveia e bolachinhas com geléia, desmontamos o acampamento e retornamos à trilha. O caminho agora se tornava mais agradável, pois sempre passávamos por várias ruínas, fortalezas e caminhos de pedras. Conhecemos as ruínas de Sayacmarca (3.500m), Phuyupatamarca e Wiñaywayna, onde montaríamos o acampamento 3. Um detalhe que nos chamou a atenção é que os incas, hábeis construtores, adoravam escadas. Sobe, desce, passamos por um acampamento intermediário, que se encontra no alto de uma colina. Um guia local nos avisou que se o acampamento inferior estivesse lotado, dificilmente conseguiríamos local para acampar. Certo ou errado, montanhas são locais onde devemos tomar decisões, decidimos então arriscar e continuamos a descer pelas escadas, que não tinham fim, até chegarmos a uma pequena pousada que serve de alojamento para os montanhistas que contratam os serviços de guia. Como nesse dia decidimos caminhar mais lentamente para curtirmos a trilha, chegamos no acampamento muito tarde. Como o guia nos alertou - estava lotado. Procuramos e não havia lugar para uma barraca se quer, foi então que resolvemos montar um bivaque na área de um bar que fora abandonado. Todos os nossos companheiros de viagem que por ali passavam, não acreditavam que dormiríamos naquele lugar. Como o local tinha uma bela vista, parecia confortável e nosso objetivo era levantar às 5:30 da manhã para caminharmos o último trecho da trilha, nos instalamos, armamos o tradicional chimarrão e ficamos curtindo nossa última noite nas montanhas peruanas. Sob o lindo céu emoldurado pelas altas montanhas nevadas da Cordilheira Real, jantamos e fomos dormir.

terça-feira, 20 de julho de 1999

Passo Warmiwañusca.

Após uma bela noite de sono, sob um céu fantástico e temperatura em torno dos 10ºC, saimos das barracas. Logo tomamos café, desmontamos o acampamento e seguimos a trilha em nosso segundo dia de caminhada - o mais pesado!
Logo na saída, deveríamos subir por uma colina por mais de 2 horas, cruzar o passo Warmiwañusca (4.200m), descer a encosta da montanha e atingir o acampamento 2 - próximo a ruína denominada Runquracay (3.860m). Esta ruína, por sua vez, funcionava como um ponto de observação dos incas. De Runquracay os incas poderiam avistar a todos que se aproximavam. Durante toda a trilha subimos e descemos muito. Quando estávamos próximos ao passo, começou a chover e a temperatura, que antes era de 15ºC, despencou à 0ºC! A chuva grossa se transformou em neve, o nosso objetivo estava logo à frente. Quando parávamos para descansar quem nos dava apoio eram os carregadores que, com seus enormes fardos, caminhavam ao nosso lado e falavam constantemente palavras de incentivo na língua queichua. Quando cheguei ao alto da colina olhei para trás e, antes que a neblina nos cobrisse, avistei várias pessoas que continuavam a subir vencendo a chuva, o frio e a neve. A trilha continuava e agora faltava descer até o acampamento 2, que se encontrava 1 hora e 30 minutos montanha abaixo. Chegando no acampamento 2, notamos que as condições para camping não eram as melhores, as grandes expedições ocupavam todos os lugares com cerca de 50 barracas. Muitos montanhistas "desavisados" montavam suas barracas próximo às vertentes de água poluindo-as e inviabilizando o consumo - ainda bem que levamos filtro! Nosso amigo Alberto chegou bastante debilitado e passando mal devido a altitude. Mesmo separados uns dos outros conseguimos acampar. Outro detalhe importante para quem pretende refazer o Caminho Inca, é nunca deixar nada fora da barraca, nem mesmo as botas, ao menos se quiser caminhar toda a trilha de pés descalços - o que desaconselho. No acampamento 2 pequenos furtos são muito comuns!

segunda-feira, 19 de julho de 1999

Pé na trilha.

Eram 7:00 da manhã quando o motorista da caminhonete veio nos buscar no hotel, onde já aguardávamos com ansiedade. Depois de colocarmos todas as mochilas, mais uma vez sobre o carro, partimos para a Trilha Inca.
ATÉ QUE EM FIM!
O caminho é, lindo! Passamos por varias colinas de onde avistamos grandes montanhas nevadas e o trem, lá no fundo do vale, levando os turistas até a entrada do parque. Depois de quase duas horas de asfalto, chegamos até uma estrada de chão batido e foi aí que arrependemos. Nosso motorista disse que a van não poderia mais passar devido ao mau estado da estrada e que o jeito era seguir o resto do caminho a pé. Após descarregarmos, o motorista deu meia volta e retornou a Cuzco. Demorou um pouco, mas logo descobrimos que tínhamos sido enganados e que faltava muito caminho ainda até a entrada do parque. Para nossa surpresa, logo conseguimos carona em um caminhão que nos deixou na entrada do parque. Mais uma vez, colocamos as mochilas nas costas (cada uma com aproximadamente 20 Kg) e começamos a nossa peregrinação.
No interior do parque cruzamos o rio Urubanba exatamente no mesmo ponto onde Hiran Bingan (1912) iniciou sua busca à cidade perdida de Machu Picchu. Logo ficamos impressionados com a quantidade de pessoas que se preparavam para a caminhada. Grande parte delas sem mochilas, pois quem as levava eram os carregadores da região. O dia estava perfeito, temperatura em torno dos 20ºC. Logo todos os grupos, cada um em seu ritmo, começaram a se distanciar. Nós, mesmo estando todos bem carregados, passamos por quase todos os grupos mais lentos que estavam a nossa frente. A trilha é muito bem marcada e não há hipótese de alguém se perder. Nesse primeiro dia logo avistamos a ruína de Pattalacta e, após mais 5 horas de caminhada, chegamos ao acampamento 1, denominado Wayllabamba. Um pequeno vilarejo onde, até hoje, existem algumas casas de descendentes dos incas que trabalham na lavoura e transporte de equipamentos para os turistas. Logo começamos a montar nossas barracas. Crianças se aproximavam para conseguir qualquer coisa que poderíamos dar. Contraste. Montamos rapidamente o acampamento, aproveitamos para descansar e observar o restante do pessoal que chegava.

domingo, 18 de julho de 1999

Conhecendo Cusco.

Neste dia resolvemos descansar e conhecer a cidade. Cuzco é pequena e aconchegante! O local que mais atrai os turistas e aventureiros na cidade é a Plaza de Armas. Bela, cercada por duas grandes igrejas que datam do século XVII, muitos centros turísticos, operadoras de esportes radicais além, é claro, de restaurantes apetitosos! Não faltam os tradicionais artesãos vendendo roupas feitas de lã de alpaca e guanaco - uma das principais atividades comerciais do Peru. Também visitamos a famosa pedra dos 12 ângulos que fica no muro do Palácio Inca Roca.
Nestes "dias de descanso" nos preparamos para a trilha, comprando comida, pesquisando um meio de transporte mais apropriado para nos levar até o início do caminho e divulgando, em meio aos turistas de todos as culturas, o nosso chimarrão. Resolvemos alugar uma caminhonete com uns amigos paulistas que encontramos por lá - decisão que, mais tarde, seria questionada.

sábado, 17 de julho de 1999

La Paz - Cuzco.

Finalmente seguimos viagem, desta vez, em um micro lotado de montanhistas de todas as partes do mundo. Enquanto viajávamos, rezávamos para que nossas mochilas continuassem presas em cima do micro. Se um dos nós se soltasse, com certeza, perderíamos algumas mochilas em um dos vários precipícios por onde passávamos e isso seria um grande problema. Antes de chegarmos em Copacabana, teríamos que atravessar o lago mais alto do mundo, o Titikaka (3.810m) - divisa entre Bolívia e Peru. Em Copacabana, já no lado peruano, paramos para almoçar e trocar de ônibus. De lá seguiríamos até Puno, para mais uma troca de ônibus e seguir, definitivamente, até Cuzco. Outro detalhe importante é que, até aqui, mudamos de fuso horário duas vezes. A primeira, em Campo Grande, e agora na fronteira com o Peru - estávamos duas horas a menos que no Brasil. Até Cuzco a viagem havia se tornado muito cansativa, pois já estávamos viajando há sete dias com apenas uma noite em pousada.
Ainda era madrugada quando chegamos em Cuzco (Qosqo em queichua), fomos logo procurar um local para nos instalar. Encontramos o Hotel Koricancha - indicado por um guia turístico em Puno. Era amplo, limpo, confortável e encontrava-se bem próximo ao centro de Cuzco e a estação de trem.

sexta-feira, 16 de julho de 1999

Santa Cruz de la Sierra - La Paz.

No dia seguinte, lá pelas 8:30 da manhã, chegamos em Santa Cruz de la Sierra, onde pegamos um táxi da estação até a rodoviária. De lá seguiríamos viagem para La Paz, a capital da Bolívia!
Em contraste com os trens, os ônibus eram ótimos, muito confortáveis se não fosse por um detalhe - não têm banheiros! É, nada pode ser perfeito. Nesta viagem, que duraria 21 horas, cruzamos por vales e alguns trechos de montanha acima de 4.000 metros de altitude. Na mesma noite nosso ônibus foi obrigado a parar e permanecer na estrada por mais de duas horas, devido a neve na pista. Só no dia seguinte constatamos os estragos provocados pela tempestade. Um ônibus que vinha na direção oposta a nossa se chocou com um caminhão e as vítimas ainda permaneciam sobre a pista coberta de gelo. Medo!
Só no fim da tarde chegamos a La Paz (3.500m). Ficamos espantados ao ver a grande cidade construída em um vale cercado por belas montanhas como o Illimani (6.462m). Ainda na rodoviária, procuramos uma agência de turismo para trocarmos os nossos dólares por pesos bolivianos e para obtermos algumas informações sobre as pousadas e pontos turísticos da cidade. Ficamos sabendo que a empresa que nos prestou as informações tem um micro que, no dia seguinte, levaria algumas pessoas à Copacabana - divisa da Bolívia com o Peru. De lá seguiríamos, em outro ônibus, até Cuzco. Aproveitamos e compramos mapas e passagens.
Carregados de informações e possibilidades, nos acomodamos na pousada Alamos - a mais próxima da rodoviária. Tomamos o banho que faltava e saímos para conhecer a cidade e iniciar um lento processo de aclimatação - já estávamos a mais de 3.000 metros de altitude! La Paz é uma cidade grande. Apesar de cinza, devido as casas sem reboco, e parecer meio mórbida, o centro é bem agitado. Depois de três dias sentados em bancos de trens e ônibus, nada melhor que um bom banho, jantar pizzas gigantes e uma boa noite de sono em uma cama limpa. Atenção: Em alguns locais da Bolívia, enquanto o ônibus não enche, o motorista não dá a partida!
Paula A.

quinta-feira, 15 de julho de 1999

No trem da morte.

Pela manhã, após o café, seguimos direto para a estação de trem. Logo ao chegarmos, descobrimos que não havia mais passagens para o mesmo dia nas 1º e 2º classes e, se quiséssemos viajar no mesmo dia, teríamos que comprar bilhetes para a última classe. Então, para não perdermos mais um dia (e a classe), decidimos embarcar no trem. Assim que compramos as passagens, começamos a olhar ao nosso redor e observar o que encontraríamos pela frente. Além de nossas imensas mochilas, teríamos que dividir o espaço dos pequenos corredores do trem com os bolivianos carregados de sacos e caixas de produtos compradas na fronteira, além de crianças, galinhas e muitas outras coisas que é melhor não tentar descobrir. Quando o trem chegou, iniciou-se uma correria de pessoas com caixas e sacolas que muitas vezes eram lançadas para dentro do trem. Nós tentávamos achar nossos lugares no meio dessa bagunça, que piorou ao descobrirmos que dividiríamos o pequeno banco de madeira, não reclinável, com mais três pessoas acompanhadas de mais uma ou duas crianças. Ao nos "acomodarmos", tivemos que aguardar a confusão gerada entre bolivianos (contrabandistas) e fiscais da Polícia Federal Boliviana que, ao perceber que os produtos não tinham notas fiscais, jogavam tudo pela janela com o trem já em movimento. Pancadaria geral, rumo a Santa Cruz de la Sierra! As 20 horas de viagem custavam a passar e, em cada parada, as pessoas invadiam os corredores vendendo "tchicha", um líquido de aparência estranha, acondicionado em um balde de procedência questionável. O jantar, um aquoso arroz com galinha servido em um pratinho de plástico, era oferecido por ambulantes, pela janela, quando o trem parava. Pasmos observávamos, com curiosidade, o voraz apetite dos bolivianos. Infelizmente é muito difícil descrever, em poucas palavras, toda a cena que presenciei durante aquele "fabuloso jantar".
Prosseguindo a viagem, ao cair da noite, mulheres e crianças, aos poucos, iam se acomodando no melhor lugar - o chão do trem. Logo não havia mais condição de caminhar dentro dos quatro vagões que compunham a 2º classe. Tentar chegar até o banheiro, que tinha uma privilegiada vista dos trilhos, tornava-se uma verdadeira corrida sobre bancos, bagagens e pessoas deitadas pelo chão. Passamos a noite tentando encontrar uma posição menos pior para dormir - ninguém conseguiu ...
Paula A.